terça-feira, 25 de março de 2008

Telemóvel, meu amor...

Já tinha sentido o impulso de escrever sobre o episódio da violência duma aluna sobre uma professora, na Escola Carolina Micaelis, no Porto, por causa dum telemóvel indisciplinado na sala de aula.

Perante a avalanche de notícias, imagens repetidas e comentários, mais ou menos politicamente correctos, acabei por desistir.

Mas hoje, à hora sempre calma e familiar do jantar, foram divulgadas novas imagens de outros casos de indisciplina escolar. Não resisti.

Estou à beira de fazer 50 anos, tenho uma filha que acabou de fazer 23 anos e sinto uma amarga tristeza com as notícias que me entram pela casa dentro. Sou filho de operários que mal sabiam pegar num lápis - a minha mãe era quase analfabeta e o meu pai mal sabia ler e escrever - mas souberam sempre ensinar-me a respeitar os outros e em particular aqueles que tinham alguma coisa para me ensinar.

Lembro-me bem deles fazerem economias, muitas vezes tirando ao estômago, para comprarem os livros que eu precisava para a escola. Viviamos todos num pais mergulhado numa ditadura que parecia não ter fim e que nos isolava do resto do mundo mas, ainda assim, os meus pais operários sabiam a importância da educação e da vida em sociedade. Mesmo que o não soubessem expressar.

Talvez graças a eles, que infelizmente já partiram, ainda hoje sou um estudante quase compulsivo e continuo a cultivar um profundo respeito por aqueles que me ensinam. Foi também graças a uns e a outros que consegui construir a minha vida, pessoal e profissional.

Mesmo que sem subserviência, nunca conseguiria deixar de respeitar um professor e a sua nobre função. Mesmo quando, já no Liceu de Queluz, promovi uma greve de toda a turma a uma prova escrita de geografia. Porque a professora, por sinal minha camarada de partido, tinha quebrado o hábito escolar de marcar as provas de avaliação com dois dias de antecedência.

Mas logo que acordámos com a professora uma nova data para o teste lá estivemos todos, ordeiros e disciplinados, a realizar a prova (que por sinal haveria de correr muito bem para a grande maioria da turma).

Fosse por outros valores que a aluna do Carolina Micaelis lutasse e todos teriam ganho alguma coisa, sem que ninguém tivesse perdido ou fosse agredido.

Tentei educar a minha filha com os mesmos valores de liberdade de pensamento, mas também de respeito pelos outros. Não sei se consegui. Mas até hoje, mesmo quando a professora da primária lhe dava "bolachas" na cara por ela teimar em pintar o sol de azul e o céu duma outra cor qualquer, nunca a Joana faltou ao respeito a um professor.

Mesmo que discorde deles, o que acontece com frequência, e que escolha o fim das aulas para manifestar o seu desacordo. 

Tem a quem sair.

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